sábado, 19 de maio de 2012

O que uma azeitona tem a ver com a Filosofia?


Você sabe qual a origem da palavra “conserva” ou “conservo”?
Significa, literalmente – com servo.
E isso, graças ao filósofo Hegel (filósofo moderno alemão) que construiu um pensamento de dialética em que um sujeito só se afirma em sua relação com o outro e que, isoladamente, nada representa.
Difícil? Nem tanto... Hegel fala da sobreposição das coisas, e em seu célebre caso “Senhor e Servo” ele nos introduz à sua dialética, de onde podemos entender então, a origem da palavra em questão. Vejamos a metáfora hegeliana a seguir:

Dialética do senhor e do escravo
Dois homens se enfrentam numa luta de reconhecimento. O primeiro arrisca a sua vida em prol do reconhecimento, o outro, por medo de perder a sua vida, se submete. Instaura-se assim uma relação entre senhor e servo. Senhor é senhor pelo seu servo e o servo é servo pelo seu senhor. Nenhum deles é o que é sem o outro. Este é o reconhecimento. O vencedor (o senhor) não mata seu adversário vencido (o servo), mas o conserva, pois é pelo servo que o senhor é reconhecido como senhor. Conservar, literalmente, significa com-servo, isto é, produzir um servo, que é resultado imediato da luta pelo reconhecimento.[1]

É claro que isso é uma metáfora e que servo e senhor aqui podem significar muitas coisas. O importante é fazer a relação da etimologia da palavra que usamos atualmente. Hegel observou esta dialética quando notou que a derrota prussiana foi um “mal necessário” ao espírito alemão, que serviu de alavanca para que, naquela situação histórica, a Alemanha pudesse ressurgir das cinzas.[2]
Fazendo então uma atualização semântica, podemos estabelecer uma relação de que tudo aquilo que mantemos conosco de maneira submissa equivale ao que irá nos servir. Mantemos uma relação de senhor com algo que dominamos e que prevemos com relação a como o objeto irá nos servir, por quanto tempo e de que maneira. Continuando o desdobramento filosófico do tema, é bom saber que há uma lógica interna da dialética hegeliana que se trata de uma marcha negativa da dialética. A metáfora de Hegel continua sua explicação dizendo que pelo fato de o servo ficar alheio aos produtos que produz para o seu senhor, acaba tendo que superar suas provações, tem que lutar e usar de criatividade para viver sem aquilo que produz para o senhor, e isso o transforma em um indivíduo que ganha mais liberdade que o seu próprio senhor porque produz e o senhor, por sua vez, apenas consome. A incapacidade senhoril de produzir e de criar, levando o senhor a ficar refém da produção de seu servo é chamada por Hegel de desvanecer contido, e a mudança de perspectiva de liberdade criada pelo servo é por ele chamada de desejo refreado.
Assim, quando você tem uma lata de azeitona em conserva em sua geladeira, a relação de conserva é cíclica, seguindo os moldes dialéticos hegelianos. Por quê? Porque ao mesmo tempo em que a azeitona é a senhora da relação entre ela e o líquido no qual está imersa, ela também é a portadora de um desvanecer contido, uma vez que, depende daquele líquido para permanecer em sua utilidade no fim para o qual foi posta em conserva.



[1] HEGEL, G. W. F. A. A fenomenologia do espírito. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Os pensadores)
[2] Sobre a guerra franco-prussiana que derrotou a Prússia impondo a necessidade de uma renovação cultural e espiritual da nação alemã.

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