sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Cora Coralina: Raízes de Aninha




Tantos se dizem apaixonados pela figura de Cora Coralina...
Eu era mais uma dessas que me dizia apaixonada pela velhinha goiana que escrevia poesias e fazia doces. Até aqui, havia lido uma biografia, algumas crônicas, alguns contos, várias ou muitas poesias, diversos documentários, os quais, inclusive, tratavam direto com a poetisa.
O que eu não poderia imaginar era que ela realmente voltaria, tal como prometera em seu epitáfio.

"A pedra de meu túmulo
será enfeitada de espigas de trigo
e cereais quebrados
minha oferta póstuma às formigas
que têm suas casinhas subterra
e aos pássaros cantores
que têm seus ninhos nas altas e floridas frondes.
Eu voltarei...”
Cora Coralina

Não poderia eu imaginar que ela voltaria pelas mãos de um anjo, que possivelmente, ela mesma enviou. As mãos daquela que, dentre tantos e dentre poucos, também encontrou na figura da velhinha da casa velha, na aurora do cronos, na fortaleza encarnada, essas mãos que me dedicaram um livro... Um livro que encerra uma vida transformada, uma aura iluminada, uma em dez, uma em mil, uma em todas.

Dividiu as águas profundas, mansas e turbulentas de meu mar o livro “Cora Coralina: Raízes de Aninha”.

Não tenho crítica literária para fazer à referida obra e nem analiso seus autores criticamente. Não cabe... Porque não cabe mais em mim o transbordar de poesia em chão batido, o chão nosso de cada dia refrigerado de flores, rosas, ipês, borboletas...

Tive eu um encontro pessoal com Cora Coralina. É um transfigurar de seu corpo em palavras que encontraram o espelho dentro de mim. Encontrei-me com Cora. Conheci Cora. Vivi com Cora. Senti o cheiro de Cora. Perpassei as orações de Cora. Senti o calor e as rugas de suas mãos. Percebi seus dedos calejados e tortos entrelaçados aos meus. Dilatei meu coração. E de repente, foi um misto de transe e erupção vulcânica. Até meu corpo teve dor... Ela, realmente, voltou. E eu, realmente, a vi.

Entendo agora e até respondo a dúvida que pairava com os escritores desta obra sobre o “para quê” de mais uma biografia de Aninha. Porque, ainda que leias todas as biografias sobre Cora, qualquer uma delas poderá ser dispensada em virtude dessa. Em virtude das raízes que aqui, oferecem a seiva que nutria a velha, que nutria a jovem e que nutre o mundo. Essas raízes nos oferecem um encontro espiritual e carnal. Sinestesia extrapolada. Um mergulho nos ares correntes da casa velha, da velha, da ponte, do rio... Esse livro – Cora Coralina: Raízes de Aninha – é um manual sobre como ler Cora... Como ler suas poesias, sua vida, sua mensagem. Apresenta-nos Cora assim: olho-no-olho, mão-na-mão, raio-em-copa.

Não quero parecer uma herege ao universo cristão, portanto peço licença... Mas Raízes de Aninha tornou-se meu Evangelho. Nunca tão encarnado. Nunca tão frutificado em mim como agora. O cultivo das rosas em terra vermelha fez esparramar polens até meu coração. Sinto que dele, começam a nascer rosas... Nunca tive rosas no coração se não me esforçasse muito pra isso. Agora, elas brotam assim, com o mínimo cultivo.

Olho ao redor, vejo Cora. Tem um sopro aqui ao pé do ouvido... É Cora... Sua voz... Ela me fala o tempo todo. Vou tratar de vida corriqueira, fala Cora aqui pra mim. Vou parar para rezar, parece que ela me empresta seu coração e de presente, sua fé. Vou admirar-me da vida, da família que cresce, ela me empresta seu olhar... Não, não deixei de ser eu mesma. Não sofro crise existencial ou de identidade. Ela, o evangelhozinho simples da labuta, da humildade, da esperança e da força penetra aqui no meu pobre coração e me ensina coisas que já avançava o tempo de eu aprender.

Agora sim, eu entendo de Cora. Sinto-me sua filha. Mais uma... Isso foi o que o debulhar dessa espiga dourada intitulada “Cora Coralina: Raízes de Aninha” veio trazer ao milharal de minha vida. Digo sem pretensão, com humildade mas com certeza: sou doutora em Cora Coralina. Presente de anjo dá nisso... A obra está pronta a fazer mais doutores que se dispuserem em alma e tempo. Esse pleno entendimento não é mérito meu. É mérito dos outros filhos de Cora que, com esmero, a fizeram reviver nessas linhas de ouro. Obrigada: Clóvis Carvalho Britto & Rita Elisa Seda.

Dedicatória da autora Rita Elisa Seda (quem me presenteou com a obra)



Também eu quero chegar à minha casa velha da ponte...
Não sei que casa
Não sei quão velha
E não sei qual ponte



Casa Velha da Ponte em Goiás, onde viveu Cora Coralina.
Hoje, Museu Casa de Cora Coralina - Goiás.
Apenas sentir no findar de minha vida algo assim...
Viver valeu a pena
O tempo é meu amigo
E o chão é sim batido



Giselle Lourenço

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