Tantos
se dizem apaixonados pela figura de Cora Coralina...
Eu
era mais uma dessas que me dizia apaixonada pela velhinha goiana que
escrevia poesias e fazia doces. Até aqui, havia lido uma biografia,
algumas crônicas, alguns contos, várias ou muitas poesias, diversos
documentários, os quais, inclusive, tratavam direto com a poetisa.
O
que eu não poderia imaginar era que ela realmente voltaria, tal como
prometera em seu epitáfio.
"A
pedra de meu túmulo
será
enfeitada de espigas de trigo
e
cereais quebrados
minha
oferta póstuma às formigas
que
têm suas casinhas subterra
e
aos pássaros cantores
que
têm seus ninhos nas altas e floridas frondes.
Eu
voltarei...”
Cora
Coralina
Não poderia eu imaginar que
ela voltaria pelas mãos de um anjo, que possivelmente, ela mesma
enviou. As mãos daquela que, dentre tantos e dentre poucos, também
encontrou na figura da velhinha da casa velha, na aurora do cronos,
na fortaleza encarnada, essas mãos que me dedicaram um livro... Um
livro que encerra uma vida transformada, uma aura iluminada, uma em
dez, uma em mil, uma em todas.
Dividiu as águas profundas,
mansas e turbulentas de meu mar o livro “Cora Coralina: Raízes de
Aninha”.
Não tenho crítica literária
para fazer à referida obra e nem analiso seus autores criticamente.
Não cabe... Porque não cabe mais em mim o transbordar de poesia em
chão batido, o chão nosso de cada dia refrigerado de flores, rosas,
ipês, borboletas...
Tive eu um encontro pessoal
com Cora Coralina. É um transfigurar de seu corpo em palavras que
encontraram o espelho dentro de mim. Encontrei-me com Cora. Conheci
Cora. Vivi com Cora. Senti o cheiro de Cora. Perpassei as orações
de Cora. Senti o calor e as rugas de suas mãos. Percebi seus dedos
calejados e tortos entrelaçados aos meus. Dilatei meu coração. E
de repente, foi um misto de transe e erupção vulcânica. Até meu
corpo teve dor... Ela, realmente, voltou. E eu, realmente, a vi.
Entendo agora e até respondo
a dúvida que pairava com os escritores desta obra sobre o “para
quê” de mais uma biografia de Aninha. Porque, ainda que leias
todas as biografias sobre Cora, qualquer uma delas poderá ser
dispensada em virtude dessa. Em virtude das raízes que aqui,
oferecem a seiva que nutria a velha, que nutria a jovem e que nutre o
mundo. Essas raízes nos oferecem um encontro espiritual e carnal.
Sinestesia extrapolada. Um mergulho nos ares correntes da casa velha,
da velha, da ponte, do rio... Esse livro – Cora Coralina: Raízes
de Aninha – é um manual sobre como ler Cora... Como ler suas
poesias, sua vida, sua mensagem. Apresenta-nos Cora assim:
olho-no-olho, mão-na-mão, raio-em-copa.
Não quero parecer uma herege
ao universo cristão, portanto peço licença... Mas Raízes de
Aninha tornou-se meu Evangelho. Nunca tão encarnado. Nunca tão
frutificado em mim como agora. O cultivo das rosas em terra vermelha
fez esparramar polens até meu coração. Sinto que dele, começam a
nascer rosas... Nunca tive rosas no coração se não me esforçasse
muito pra isso. Agora, elas brotam assim, com o mínimo cultivo.
Olho ao redor, vejo Cora. Tem
um sopro aqui ao pé do ouvido... É Cora... Sua voz... Ela me fala o
tempo todo. Vou tratar de vida corriqueira, fala Cora aqui pra mim.
Vou parar para rezar, parece que ela me empresta seu coração e de
presente, sua fé. Vou admirar-me da vida, da família que cresce,
ela me empresta seu olhar... Não, não deixei de ser eu mesma. Não
sofro crise existencial ou de identidade. Ela, o evangelhozinho
simples da labuta, da humildade, da esperança e da força penetra
aqui no meu pobre coração e me ensina coisas que já avançava o
tempo de eu aprender.
Agora sim, eu entendo de Cora.
Sinto-me sua filha. Mais uma... Isso foi o que o debulhar dessa
espiga dourada intitulada “Cora Coralina: Raízes de Aninha” veio
trazer ao milharal de minha vida. Digo sem pretensão, com humildade
mas com certeza: sou doutora em Cora Coralina. Presente de anjo dá
nisso... A obra está pronta a fazer mais doutores que se dispuserem
em alma e tempo. Esse pleno entendimento não é mérito meu. É
mérito dos outros filhos de Cora que, com esmero, a fizeram reviver
nessas linhas de ouro. Obrigada: Clóvis Carvalho Britto & Rita
Elisa Seda.
Dedicatória da autora Rita Elisa Seda (quem me presenteou com a obra) |
Também eu quero chegar à
minha casa velha da ponte...
Não sei que casa
Não sei quão velha
E não sei qual ponte
Casa Velha da Ponte em Goiás, onde viveu Cora Coralina. Hoje, Museu Casa de Cora Coralina - Goiás. |
Apenas sentir no findar de
minha vida algo assim...
Viver valeu a pena
O tempo é meu amigo
E o chão é sim batido
Giselle
Lourenço
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